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A Marca de um País (2)

Em Janeiro de 2017, mandei um e-mail como esse, analisando a mudança de marca do governo federal na transição Dilma-Temer. Na época, a análise foi feita do ponto de vista do design, tentando ao máximo não influenciá-la com questões ideológicas.

Agora, 2019, a gestão Bolsonaro apresenta seu logotipo (criado pela Secretaria de Comunicação do Governo). Sempre que uma marca de governo é modificada, chovem críticas e comentários. Nesse e-mail, apresentarei minha contribuição à discussão, seguindo a toada do e-mail anterior em que o foco é a comunicação e o design e não as qualidades dos posicionamentos políticos. Ou seja, essa é uma análise crítica à marca e não ao governo. Simpatizantes e haters de Bolsonaro, acalmem-se.

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Para começar, é importante colocar a marca em perspectiva. Acima encontram-se as 4 últimas marcas de nosso governo. Uma crítica corrente à marca bolsonarista cai por terra nessa comparação: o fato de ser uma marca ultra patriótica por se utilizar das cores da bandeira nacional e da palavra “pátria”. Vemos claramente que a marca da 2ª gestão Dilma tem exatamente esses mesmos dois elementos e nem por isso foi acusada de patriotismo exacerbado na época. É claro que o adjetivo “educadora” após “pátria” confere um significado totalmente diferente ao slogan, mas o fato é que a marca de Bolsonaro se utiliza das cores de nossa bandeira e de um trecho de nosso hino e isso per si não confere um caráter ufanista à marca. Essa percepção é, sim, um reflexo do discurso do presidente que é projetado na marca. Se o slogan “Brasil acima de tudo e deus acima de todos” usado pelo presidente estivesse presente na marca, aí a análise seria outra. O exercício aqui é tentar separar as coisas.

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Muito já foi falado sobre o logo em termos técnicos e de acabamento; destaco os problemas de utilização (na redução da marca, os dizeres “Governo Federal”, importantíssimos, podem desaparecer por ter um peso muito menor do que “Patria Amada Brasil”, especialmente na versão vertical da marca, mostrada abaixo) e um mal acabamento tipográfico (principalmente o espaço entre letras). Aos olhos de um designer experiente, a marca realmente deixa a desejar tecnicamente. No tweet de apresentação da marca, Bolsonaro se orgulha do pouco orçamento utilizado na divulgação da mesma, mas parece também não ter se importado com o investimento feito na criação do logo. Nada contra a opção caseira de criação (a SECOM), mas parece que a Secretaria não possui um designer profissional qualificado em seu quadro de funcionários. Uma coisa é economizar no que se acredita ser supérfluo, outra bem diferente é confiar uma tarefa a alguém não qualificado. Ainda mais a tarefa de criar a marca mais importante de um país. Podemos dizer que, pelo menos nesse caso, o presidente não escolheu seu “Posto Ipiranga” de forma adequada.

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A representação de um sol nascente é bastante clara (apesar do “sol azul” já apontado por alguns) e, somada à curva crescente (em branco na parte negativa do símbolo) denota sentimentos de um novo dia, de mudança e de esperança no futuro. Porém, a concepção artística da marca vai na contra-mão esses valores. Dois fatores causam esse ruído: o uso do degradê e a escolha tipográfica.

Marcas com degradê podem ser polêmicas. Hoje em dia, o uso do degradê em logos se justifica especialmente em marcas nativas digitais. Sendo uma marca nativa do mundo off-line, o logo do governo poderia apresentar-se em versões com e sem degradê, mas isso não consta no manual oficial da marca (consta apenas uma versão PB conforme mostrado acima). O degradê na marca do governo não parece ter um objetivo claro. Ele é gratuito e, assim, pode remeter a algo antigo e ultrapassado quando impresso (o uso do degradê em logos é uma marca dos anos 90).

A escolha da tipografia também é equivocada. Além do fato de ser utilizada uma família tipográfica criada para outra finalidade (a família Signika foi criada para ser utilizada em sinalizações, como explica o designer Felipe Sabatini nessa matéria), a fonte é de espessura fina e personalidade fraca. Fica muito longe de refletir o pulso firme que o governo vendeu em sua campanha e transmite pouca, ou nenhuma, segurança.

O saldo disso tudo é uma marca fraca e mal-acabada, que preza pelo significado mas vacila na hora de entregar um resultado sólido que o represente. Sinal dos tempos? Vamos aguardar.

Para entrar em contato com este designer que vos fala, use o e-mail designcajueiro@gmail.com ou o tel/whats (11) 9762.80361. Obrigado e até a próxima!

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